Está cada dia mais difícil depender do sistema de saúde público no Rio de Janeiro. Os hospitais municipais, antes vistos como uma opção à grave crise que atinge as unidades de saúde estaduais, começam também a sofrer com os reflexos do aumento da demanda somado a má gestão para mantê-los.
Todas os oito grandes hospitais municipais da cidade que possuem atendimento de emergência estão sofrendo com a falta de materiais básicos em estoque. Faltam luvas, gazes, remédios simples como antibióticos e analgésicos, e em casos mais graves, como o do Hospital Salgado Filho e o Rocha Faria, faltam roupas de cama para os leitos e sabonete para lavar as mãos, respectivamente.
O problema é tão grande que, para continuar dando conta de cirurgias de emergência, não houve outra alternativa senão suspender, em cerca de 70%, as cirurgias eletivas (programadas).
No Hospital Salgado Filho, no Méier, Zona Norte da cidade, além da roupa de cama, faltam 146 insumos básicos e 57 tipos de medicamentos. Essas baixas fizeram com que o número total de procedimentos cirúrgicos, que gira em torno de 550 ao mês, caísse para cerca de 450 atendimentos no mês passado. A saída encontrada pelas unidades para que o estoque de insumos básicos não fique totalmente zerado é trocar materiais com outros hospitais, em uma espécie de escambo.
A situação é mais grave ainda no Rocha Faria, onde enfermeiros e técnicos chegaram a fazer uma manifestação na porta da unidade, na manhã de ontem. Os funcionários temem o risco de infecções, já que estão em falta sabonete para lavar as mãos e descarpacks, recipientes especiais para o descarte de lixo hospitalar. O hospital só está recebendo os casos mais graves, e o SAMU já não está mais encaminhando pacientes para lá.
Sofrendo com o atraso dos salários, cerca de 30 profissionais já se demitiram do Rocha Faria, e outros 58 faltaram ao plantão da madrugada neste fim de semana. Apesar de 40% do salário de setembro já ter sido depositado, o vale-transporte ainda não foi concedido, o que dificulta o deslocamento dos funcionários até o hospital, que fica em Campo Grande, na Zona Oeste, onde as opções de transporte costumam ser escassas.
Como se não bastasse, a Comissão de Saúde da Câmara visitou o hospital e fez uma descoberta aterradora: sem condições adequadas de armazenamento, haviam cadáveres em macas, um deles já há dois dias. Das 24 geladeiras, apenas 9 funcionam, e fora da temperatura adequada.
E não há para onde correr. Até as Clínicas da Família, que prestam serviço básico de atendimento, estão sofrendo com falta de funcionários. Desde o início do ano, 174 já foram demitidos devido à falta de repasses de verba da Prefeitura para as Organizações Sociais, que administram hospitais e clínicas municipais.
A situação é gravíssima e os funcionários são unânimes em afirmar que nunca houve uma crise tão grave na saúde municipal. E a tendência é piorar: o orçamento definido pela Prefeitura para a Secretaria de Saúde para o ano de 2018 é de R$ 4,9 bilhões, o equivalente ao de 2016. Se em 2017, cujo orçamento foi de R$ 5,4 bilhões, o quadro já é péssimo, imagine no ano que vem.
A saúde pública do Rio caminha para um colapso. Esta é a gestão do Prefeito que prometeu cuidar das pessoas.
Fontes
Para manter cirurgias de emergência, oito hospitais municipais cortam 70% das operações eletivas
Funcionários do Rocha Faria protestam: ‘falta até sabão para lavar a mão’