Por Almir Aguiar
O dia Internacional das Mulheres, celebrado na última quinta-feira (8/3), é um marco na luta das mulheres pela superação da sua condição histórica de subalternidade na sociedade capitalista patriarcal e machista. São séculos de luta das mulheres trabalhadoras pelo direito à vida, pelo controle do seu corpo, contra seu apagamento cultural e intelectual, pela igualdade de condições de trabalho e salários, contra o assédio, o sexismo e o machismo.
São muitas as lutas e desafios. E no caso das mulheres negras, as lutas e desafios são redobrados. No contexto da luta geral das mulheres, é importante ressaltar que as diferenças de classe, renda e étnicas aumentam ainda mais as desigualdades. No caso das mulheres negras, as discriminações de raça e gênero se misturam aumentando a violência, a exploração e restrição de direitos.
São as mulheres negras que vivenciam essas duas experiências ao mesmo tempo. O preconceito e a discriminação por ser mulher e ser negra. Reconhecer essas diferenças, ao contrário de dividir o movimento de mulheres entre negras e brancas, incorpora a diversidade de papéis que assumem as mulheres na sociedade e os efeitos das condições de raça e gênero.
A discriminação e o preconceito em relação às mulheres negras é constante. A sua inserção no mundo do trabalho é muito mais difícil, pois precisam vencer além da barreiras estabelecidas entre homens e mulheres, as diferenças entre brancos e negros. Uma mulher negra é sempre preterida em uma vaga de emprego, diante da concorrência seja com um homem, com uma mulher branca ou mesmo com um homem negro.
Em um País que viveu três séculos de escravização da população negra, as mulheres negras ainda são vista pela sociedade como servas e são as mais agredidas, socialmente e fisicamente. No Brasil, 58,86% das mulheres vítimas de violência doméstica são negras, revelam dados de 2015 da Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180).
Os números da violência de todos tipos contra a mulher negra são gritantes. Entre o total de mulheres vítimas de mortalidade por parto, 53,6% são negras, de acordo com o Ministério da Saúde (2015). Entre as vítimas de violência obstétrica, 65,9% são negras (Cadernos de Saúde Pública 30/2014/Fiocruz)
Feminicídio
De acordo com o Diagnóstico dos homicídios no Brasil (Ministério da Justiça/2015) 68,8% das mulheres mortas por agressão também fazem parte desta população.
Mulheres negras têm duas vezes mais chances de serem assassinadas do que as brancas. A Taxa de homicídios por agressão é de 3,2 entre 100 mil brancas. Essa proporção mais do que dobra em relação às mulheres negras: 7,2 entre 100 mil.
O Mapa da Violência 2015, elaborado pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), aponta um aumento de 54%, em dez anos, no número de homicídios de mulheres negras, passando de 1.864, em 2003, para 2.875, em 2013. No mesmo período, a quantidade anual de homicídios de mulheres brancas caiu 9,8%, saindo de 1.747 em 2003 para 1.576 em 2013.
No Estado do Rio de Janeiro, 56,8% das vítimas de estupros registrados em 2014 foram, de acordo com o Dossiê Mulher RJ, cometidos contra mulheres negras.
Profissões subalternizadas e precarizadas
A desigualdade de gênero e raça também aparece nas profissões e na renda das mulheres negras que acabam assumindo a posição dos trabalhos considerados subalternizados e de menor escolarização como o trabalho doméstico. De forma geral, as mulheres, independente de cor, vivem com muito mais intensidade o drama do desemprego em relação aos homens. No entanto, a diferença racial se explicita quando vemos que a taxa de desocupação das mulheres brancas é de 70% em relação aos homens, o que é altíssimo. Mas esse percentual sobre para 130% no caso das mulheres negra, de acordo com o Dossiê Mulheres Negras: retrato das condições de vida das mulheres no Brasil (Ipea, 2013)
Do total de trabalhadores, 57,6% são empregadas domésticas e estas estão menos protegidas pelo sistema de seguridade, já que a maioria trabalha sem carteira assinada e das formas mais precarizadas.
Revertendo esse quadro
A situação é desfavorável, não temos dúvidas. Mas é preciso lembrar da resistência. Precisamos lutar pela manutenção de conquistas importantes que os movimentos sociais obtiveram desde 2003, quando foi criada a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. De lá para cá houve conquistas que precisam ser reforçadas e resgatadas. Entre elas a implementação da Lei Maria da Penha e do Disque 180. É preciso reconhecer o papel fundamental do Estado no combate às desigualdades sociais e de gênero.
Outras políticas que refletem na igualdade de classe e raça e são as políticas afirmativas dos governos Lula e Dilma, nas quais a população negra teve mais acesso às universidades, através da política de cotas, e ao trabalho com as cotas implementadas também nos concursos para instituições e empresas públicas. Infelizmente essas políticas vêm sendo destruídas pelo atual governo e precisamos voltar a avançar. É possível lutar por mais conquistas de modo que tenhamos uma sociedade justa e igualitária. Vamos mudar esse quadro!
*Almir Aguiar – Secretário Estadual de Combate ao Racismo PT/RJ